quinta-feira, 18 de março de 2010

segunda-feira, 15 de março de 2010


Prá efeito de...

...continuar esse exercício de escrever, acomodar as palavras no papel ou na tela do computador - aqui elas brilham - tentar buscar o significado do pensamento em palavras dispostas lado a lado, vírgula, palavras, vírgula, palavras, um del eventual e caprichoso e assim vai, espaço, enter, espaço, enter, e a perseguição ao pensamento, rápido, com receio de perder o que se quer colocar aqui, temor de não fazer sentido algum, ou ter algum e não compreender muito bem, enfim, mas antes de prosseguir explico que esse texto é apenas breve pausa para prosseguir escrevendo sobre uma tarde quente quando começara ( quem começara? o quê começara?) a recordar como iniciara a relação com ela (que ela? quem?), o encontro no café, enfim, tá aí embaixo, é só dar uma lida, ou relida, depende, então, prosseguindo, tem um certo jeito de aventura, no mínimo, no máximo, insensatez, esse negócio de escrever, publicar num blog, ser criticado, sem nem saber dessas críticas, meio chato, se soubesse, ao menos, tentaria melhorar, mas melhorar o que, escrevo porque quero e pronto, ou ponto, que não uso, só uso vírgulas, é melhor, acho, aproxima da fala, sem lá muita pontuação, deixa-se sair a palavra, algumas são insistentes, ela que adquira pontuação e sentido na cabeça de quem ouve, se tiver algum, devolve, pronto, aí está o diálogo, que assim será compartilhado, desenvolvido, agora dois, não um, buscando o significado das coisas, não digo da vida , pretensão total, nem acho que se deva a algum significado mais misterioso e sofisticado do que viver, simplesmente viver, bastar-se viver, e encarando tudo o mais como detalhes que dão sentido prá isso, detalhes, mas quê detalhes, não é mesmo, pergunto, meio desconfiado da interrogação e afirmação, ao mesmo tempo, quase uma arrogância existencial, passando por cima de ódios e amores, mas, enfim, em certo sentido é assim mesmo que seguimos vivendo, às vezes pedantes, às vezes atrevidos, em outras tantas nem aí, às vezes muito humildes aceitando o peso de algo de que nem sabemos ao certo o que seja, às vezes com sofreguidão, outras com muita disposição, em outras ainda, ousados, tentando ponderar certezas e dúvidas, buscando segurança nesse mal disfarçado fio de equilibrista mas de qualquer maneira, sempre com muita vontade, com muito tesão em ter e fazer dessa experiência, apaixonante acima de tudo, que é a vida, simplesmente a nossa vida, e se envolver o amor, então... mas aí fico com Roland Barthes, “querer escrever o amor é afrontar o atoleiro da linguagem: esta região desesperada em que a linguagem é ao mesmo tempo muito e muito pouco, excessiva (pela expansão ilimitada do eu, pela submersão emotiva) e pobre (pelos códigos mediante os quais o amor a rebaixa e reduz)”.... "saber que não escrevemos para o outro, saber que essas coisas que vou escrever jamais me farão amado de quem amo, saber que a escrita não compensa nada, que ela está precisamente ali onde você não está - é o começo da escrita."(FDA)...mas isso é quase, novamente, retornarmos ao fio, não o da meada, e sim ao do equilíbrio...mas confesso que a minha vontade era escrever: ao fio da navalha...


Tarde quente

....e foi assim, sem nem pensar porque, ele começara a escrever algumas coisas, nem entusiasmado, nem tampouco aborrecido, apenas escrevia, sem atentar para o barulho do ventilador, constante, ligado para amenizar o calor, nossa, que tarde quente, acendia o cigarro, dava uma tragada, pensava que deveria parar de fumar, como outros tantos pensam o mesmo, nem outros tantos o fazem, entre eles, ele, colocava o cigarro no cinzeiro, lembrava de algo, parava um instante, pensava como dizer, escrever o que lembrara, do que lembrara só conseguia descrever alguns lapsos, breves intervalos com a duração da eternidade, sabe lá que eternidade, talvez a dos segundos, talvez a dos minutos, talvez a das horas, porém sempre eternidade, disso tinha certeza, não se desviara, lembrou, ela dissera, “pareceu texto de Neruda, até de Gabo....amei...você deveria escrever romances! A cena foi tudo de bom...um passar de tempo sem pressa, um viver de verdade o momento...e, óbvio, os beijos roubados, são um romance à parte...onde iam dar, outro romance...e assim escreveríamos um belo livro, a quatro mãos, vários beijos e dois corações....", imagina, esse era um dos motivos de gostar tanto dela - Neruda, Gabo, o que mostrou que a realidade é fantástica, enquanto outros entenderam que ele criara o realismo fantástico -, ora, ora, mal arranhava algumas palavras, mal conseguia colocá-las lado a lado tentando esforçando-se até, dar algum sentido ao que escrevia e ela dissera, “pareceu texto de Neruda, até de Gabo...”, linda, exagerada e exageradamente linda, não, pois é, o que ele escrevera fora uma mensagem para ela, correspondiam-se através de mensagens, mensagem em que ele interferira num texto que ela mandara. Inserira palavras, recriara pensamentos, intenções, atrevidamente interferira, na realidade estabelecera um diálogo com ela através do texto em que ambos declaravam sua paixão pelas palavras, onde criara um encontro, simples como são todos os encontros e, no entanto tão densos, tão carregados de expectativas etc. e tal, imaginara um café, desses anos vinte, trinta, art nouveau, um tanto escuro, um tanto iluminado por uma luz amarelecida, móveis escuros, antigos, cristais, espelhos, café, garçom ao canto, parado, aguardando o pedido, escutando Uno, por coincidência seu tango preferido, tocando baixinho no rádio, si yo tuviera el corazón, el mismo que perdí, si olvidara a la que ayer lo destrozó y pudiera amarte, me abrazaría a tu ilusión para llorar tu amor, nossa, andava sensível aos quereres, aos amores, aos dramas em que tudo se transforma quando nos apaixonamos, aquela paixão insolente que se instala e domina corações outonais, afinal, já tinha lá seus cinqüenta e tantos anos, plenos, vividos e sofridos, como diz o clichê, com algumas alegrias de entremeio, uma certamente, caso contrário, ninguém agüenta, e pensava no pedido, decidira por um espresso, assim, com um s ao invés de x, como manda o figurino, ela hesitava entre um cappuccino e um macchiato, optou por este, e lá estavam, um em frente ao outro, mãos se tocando sobre a mesa, em silêncio, um silêncio que logo seria rompido por ela perguntar, “me queres”, ele, surpreso disse, “te quero, sim, mais do que isso, só que não sei o que é, só sei que é, e é muito bom...”, mais um silêncio, mãos segurando-se mais forte, olhos nos olhos, sorriso esboçado nos rostos, beijaram-se, adivinhando a sequência do diálogo, ....